Em 17 de janeiro de 2004 eu saía de Santa Maria com destino a Taubaté - SP com o objetivo de realizar um dos cursos mais cobiçados pelos pilotos de asas rotativas da FAB, o Estágio de Pilotagem Tática do Exército Brasileiro. Na bagagem eu carregava uma série de dúvidas, pois eu sabia que o curso ensinaria a voar muito baixo, entretanto sabia muito pouco ou quase nada sobre a doutrina da Aviação do Exército. No decorrer do estágio descobri que havia muito mais do que eu imaginava para aprender. Outra dúvida que também me acometia era sobre a minha readaptação à aeronave, pois estava há três anos sem voar o Esquilo e sabia que o esquilo do Exército era diferente do da Força Aérea.
Ao chegar ao Comando da Aviação do Exército (CAvEx) cumpri os procedimentos protocolares e segui, sem perda de tempo, para o Centro de Instrução da Aviação do Exército (CIAvEx) pois já era esperado para iniciar uma maratona de estudos que se estenderia por cinco meses. Comecei os estudos pelos manuais da aeronave para realizar os vôos de readaptação ao esquilo, vôos que representaram uma grande cortesia do Exército. Quando fui recebido no CIAvEx compreendi em profundidade o termo Força Irmã. Fui muito bem recebido e apresentado prontamente a toda a Base de Aviação de Taubaté. Durante a minha apresentação ao comandante do CIAvEx e minha estadia nesse Centro de Instrução ouvi algumas vezes que a Aviação do Exército tinha uma dívida impagável para com a Força Aérea. Esta frase se refletiu no tratamento que recebi durante toda a minha estadia em Taubaté, e por isso agradeço, entretanto não concordo com ela em sua plenitude, pois não creio que existam dívidas quando algum conhecimento é transmitido com o objetivo de engrandecer as forças armadas brasileiras e dessa forma a própria Nação. Rapidamente realizei a readaptação ao HA-1 (conhecido na FAB como H-50) e estava pronto para iniciar o estágio. O primeiro colega que conheci foi um Capitão Tenente da Marinha Brasileira. Não imaginava que teria um colega da Marinha. Os demais companheiros de estágio eu conheci no primeiro dia, todos (éramos trinta e um no total) demonstraram desde o início um elevado companheirismo para comigo. Nas conversas iniciais comecei a me adaptar a uma característica do Exército, o uso de siglas, que prontamente me eram explicadas. Logo no início do EPT o grupo sofreu um primeiro impacto. Devido a restrições orçamentárias o número de vagas foi reduzido de trinta e uma para dez. Vinte e um militares foram desligados do curso por esse motivo. Compreendendo melhor a progressão operacional na AvEx, percebo a força que essa notícia tinha e fico ainda mais impressionado com a maturidade e a lealdade com a qual a mesma foi recebida. Faço votos para que esses 21 pilotos estejam realizando o EPT em outubro, esta era uma perspectiva que eles possuíam. Depois de algumas instruções teóricas iniciais o grupo viajou para São Pedro da Aldeia (casa de nosso colega, o CT Márcio Santos) para começar o aprendizado das manobras básicas da pilotagem tática. Nessa cidade eu descobri um vôo muito divertido e ao mesmo tempo sério e responsável. As manobras básicas ajudaram muito a desenvolver minhas habilidades de piloto de asas rotativas. Creio que essa fase inicial do curso muito se assemelha à fase de manobras e acrobacias realizada na Academia da Força Aérea que desenvolvem muito a habilidade dos pilotos. O estágio transcorreu sem maiores percalços, passando pelas fases de pista de terreno plano, pista de terreno montuoso, pista de terreno montanhoso, maneabilidade de fração de helicópteros (o que eu não tinha a mínima noção do que era e descobri ser o que chamamos na FAB de vôo em formatura tática), vôo noturno e emprego armado. As constantes conversas e discussões ocorridas entre os alunos geraram um intercâmbio entre as três forças que, unido às instruções do estágio, tornaram essa experiência incomparável. Finalmente, passados cerca de dois meses, o grupo galgava os últimos degraus da escada rumo à operacionalidade de Piloto Tático. As amizades conquistadas nesse período tornaram-se por demais valiosas e por vezes doloridas. A dor que me refiro surgiu da perda de nosso colega Fernando Antônio de Ribeiro Júnior, falecido em um acidente de HM-1 no interior do Rio Grande do Sul, perto de minha unidade. Deixo aqui minha homenagem a este valoroso colega. A todos os colegas do EPT deixo aqui minha homenagem com a frase que identificou nosso grupo: "Eu sou assim, amigo!". Após o término do EPT, rapidamente iniciava-se o Curso de Piloto de Combate (CPC), um curso que exigiu uma dedicação, bem como uma adaptação à doutrina do Exército, muito maior. Quando as instruções se iniciaram a carga teórica começou a mostrar seu peso. As provas tornaram-se mais constantes e a aplicação dos conteúdos ensinados era contínua. Dentre os diversos aprendizados desse curso, o de maior aplicação na minha unidade aérea foi a navegação tática, uma técnica de difícil aprendizado, creio que o mais difícil dentre todos do CPC, mas aos poucos a mesma foi mostrando seus segredos. Pude perceber que o planejamento de uma operação aeromóvel reveste-se, em alguns casos, de elevada complexidade e que as ordens de operações a elas ligadas abordam uma série de aspectos de forma muito diferente de um planejamento de missão da FAB. Este assunto foi pauta de várias discussões e de diversos esclarecimentos que me foram prestados durante todo o curso. Essas discussões foram mais um aspecto que fortaleceu a troca de conhecimentos. As operações aeromóveis realizadas durante todo o curso eram repletas de ensinamentos que eram apresentados nos debriefings, anotados e absorvidos pelos alunos. Essas missões foram treinadas por mais de dois meses, até que finalmente iniciava-se a tão esperada operação em Lins - SP, fase final do CPC. Nessa localidade aprendemos a fundo sobre a utilização de PRA's (um conhecimento de enorme aplicação à todas as unidades de helicóptero da FAB) e a organização de uma ZREU de pelotão. Esses conhecimentos eram sempre transmitidos durante a execução de todas as operações aeromóveis da Aviação do Exército. A Manobra de Lins encerrava-se com a execução de uma evasão em RAFE e LAFE. Terminava-se assim, também, o Curso de Piloto de Combate. Destaco aqui as amizades conquistadas nesse curso, que graças às dificuldades ultrapassadas e a união dos alunos, permitiu ao grupo realmente identificar quem era quem. Depois desses cinco meses de curso pude verificar o quanto é imprescindível para a operação conjunta das forças armadas o intercâmbio de conhecimentos. Quando o Brasil realmente entrar em um conflito armado todas as forças operarão simultaneamente e conjuntamente. Como um exemplo dessa operação pode-se citar a FAB realizando a supressão da defesa aérea inimiga para que o EB possa, com segurança, realizar um assalto aeromóvel ou atacar um comboio inimigo. As chances de se obter o sucesso são muito superiores quando a operação é realizada de forma conjunta, utilizando todos os recursos disponíveis, obtendo assim a tão desejada sinergia. Finalmente posso concluir que, apesar da importância de todos dos conhecimentos curriculares, o intercâmbio de experiências e as amizades conquistadas foram o aspecto mais importante de minha missão no exército. Posso dizer, por fim, que foi uma honra e um orgulho viver esses cinco meses com colegas de tão elevado valor. Despeço-me deixando claro que o meu apoio estará disponível a qualquer momento e em qualquer lugar que estiver. Também permaneço com a esperança de que sejam realizados maiores e mais freqüentes intercâmbios entre as três forças para que, dessa forma, possamos nos preparar melhor para executarmos nossa missão constitucional: A defesa da Pátria.
AVIAÇÃO! BRASIL! AOS ROTORES! O SABRE! 1 o Ten. - Av. Marcelo Magrinelli
QUINTO ESQUADRÃO DO OITAVO GRUPO DE AVIAÇÃO |